O impacto do Programa da Incubadora nas vidas das mulheres empreendedoras
_SocialStarters é uma empresa social que foi criada no Reino Unido há 4 anos. A empresa quer ajudar empreendedores com negócios de impacto social que estão em fase de desenvolvimento e que, por isso, faltam informações, formações e recursos para viabilizar os seus negócios. Para fazer isto, a empresa faz conexões entre os empreendedores e os profissionais especializados em diversas área (finança, marketing) que necessitam de ajuda.
Do outro lado do Pacífico a ONG ASPLANDE nasceu da vontade de criar vínculos entre as pessoas para aprender um com os outros, compartilhar o conhecimento, e criar uma rede de relações e de apoio. Hoje a ASPLANDE apoia as mulheres das comunidades e das periferias do Rio de Janeiro a viabilizar os negócios delas. Desde a sua criação em 1992, a ONG apoiou mais de 6.000 mulheres, fortalecendo as iniciativas empreendedoras. Com efeito a ASPLANDE tem um público alvo bem específico que enfrenta dois “problemas” na área do empreendimento: ser mulher e ser da periferia.
1° SER MULHER : O estudo da RAIS (relação anual de informações sociais) sobre trabalho e gênero no Brasil entre 1996-2006, revela que desde o final do século 21, as mulheres são mais e mais ativas no mercado do trabalho. As mulheres jovens obtêm mais diplomas universitários que os homens, e elas ocupam mais empregos que precisam de um curso completo (elas eram 164.900 contra 73.400 homens em 2006). Contudo elas ganham somente 56,5% do salário dos homens apesar de ter a mesma qualificação. Com efeito, o simples fato de ser mulher cria uma tripla barreira, que os sociólogos identificaram pelos conceitos de “glass ceiling”, “sticky floor” e “glass wall”. O “teto de vidro” (glass ceiling) as impedem de assumir responsabilidades dentro das empresas por conta da falta de confiança em suas competências e habilidades, o “piso pegajoso” (sticky floor) restringem as suas opções a empregos que necessitam de uma qualificação menor que obtiveram, e finalmente a “parede de vidro” (glass wall) limita o nível de responsabilidade a qual elas podem chegar, ficando restritas aos setores de menor importância na empresa (administração, comunicação). No entanto apesar desta discriminação de gênero, as mulheres apostam cada vez mais na criação de novos negócios : elas são 48% dos empreendedores (segundo as pesquisas da SEBRAE e da GEM, 2018).
2° MORAR NA PERIFERIA : “Como se não bastasse” ser mulher, as participantes das atividades de ASPLANDE também são das periferias e das comunidades do Rio de Janeiro. Essas mulheres frequentemente necessitam de uma renda extra e o empreendedorismo permite que elas liguem necessidade, paixão e talento, bem como uma liberdade maior para estabelecer os seus próprios horários, seus lugares de trabalho (o que pode facilitar a gestão do tempo profissional e doméstico) e uma independência financeira. Porém, a localização geográfica longe dos pontos chaves da economia é pouco atraente para os investidores e limita o acesso às formações de qualidade a estruturas avançadas . Os recursos financeiros limitados que elas têm deixam ainda mais difícil o alto investimento necessário a todo início de negócio. Essas dificuldades, junto com a conjuntura difícil fazem com que 57% delas parem as suas atividades no primeiro ano.
Diante destas desigualdades, a ASPLANDE e a _SocialStarters, com o apoio do British Council, criaram uma Incubadora de Negócios de Impactos Sociais para mulheres. Através de diversas oficinas que apresentam um conhecimento necessário à viabilidade de um negócio, um acesso ao financiamento, facilitado graças a parcerias, e o apoio de mentores e de uma rede, esta incubadora tem como objetivo apoiar as empreendedoras das comunidades e periferias do Rio de Janeiro. O projeto permite o empoderamento dessas mulheres e permite que elas não sejam somente “microempreendedoras sociais” informais com baixa remuneração, mas empreendedoras ativas e criativas, se tornando embaixadoras em suas próprias comunidades. O projeto conta com dois ciclos de 30 participantes.
Este artigo é o resultado de uma entrevista coletiva com 4 mulheres do primeiro ciclo das Incubadoras. Tomamos um tempo mais aprofundado com elas para saber mais sobre as suas experiências na ASPLANDE. O grupo focal foi organizado em torno de 6 tópicos : 1° uma breve apresentação pessoal e profissional, 2° o primeiro encontro com a ASPLANDE e o processo de participação mais ativo na ONG até entrar no projeto das Incubadoras, 3° as expectativas e as necessidades delas antes de entrar no programa, 4° o programa em si, 5° os pontos positivos e marcantes, 6° os pontos a melhorar, e finalmente uma palavra que resume as experiências delas com a ASPLANDE. Desta forma, resultou uma conversa de 2h que parecia ser uma reunião entre amigas, as 4 empreendedoras rindo, concordando, interrompendo a colega para acrescentar um detalhe na fala da outra, se complementando…
São mulheres que se caracterizam pela vontade de mudar as coisas, a começar pelas suas próprias vidas. Elas querem aprender mais, avançar e aproveitar a oportunidade dada à elas de subir mais um degrau. Inovar e criar sim, mas já começando o negócio do jeito certo. A ASPLANDE chamou a atenção delas por ser uma ONG séria, bem como pela particularidade de ter uma estrutura orientada especificamente para as mulheres das periferias. Elas acharam na organização não somente um lugar de falar mas também de inspiração e de ação. Quando entraram no projeto, cada uma tinha estava num estágio dos seus negócios diferente. Se uma chegou procurando respostas às perguntas específicas e técnicas (aprender a fazer um plano de negócios), a outra buscava saber se a ideia básica dela era viável, e a terceira nem sabia o que precisava porque nem tinha consciência do conhecimento dela. O público das Incubadoras é assim bem diversificado e cada mulher chega com as suas expectativas pessoais. Contudo, cada uma achou as respostas nas diversas oficinas (de desenvolvimento de negócios de impacto, de gerenciamento de negócios e de digital marketing e storytelling) e nos diversos encontros. Além disso, elas se encontravam individualmente com os seus mentores e também mensalmente com a turma inteira para abordar temas como gênero, direitos humanos e sustentabilidade, e encontrar apoio para a troca de experiências.
Ter um ritmo com prazos e metas para entregar os trabalhos e estar cercada de mulheres que estão no mesmo processo de inovação as incentivaram muito para melhorar e aprofundar os negócios delas. O conteúdo, a qualidade dos professores e a forma de ensinar, sempre ligando teoria à prática, fez a diferença. Mas o mais marcante dessa experiência foi a confiança nelas e nos seus projetos que elas tiraram da Incubadora até hoje (depois de 5 meses). Elas viram que os negócios delas faziam sentido, que era trabalho de verdade e viável, e que tinha valor: era finalmente possível fazer um negócio social e ganhar dinheiro com isso. Na ASPLANDE elas se sentiram acolhidas com calor humano e se sentiram verdadeiras empreendedoras sendo tratadas com seriedade profissional. Legitimadas nos processos de inovação, elas passaram a botar em prática o que que tinham aprendido nas aulas : se organizar melhor, saber cobrar o preço justo ao público certo, apresentar os negócios para os investidores, se apoiar uma na outra. Elas descobriram esta última pérola tarde demais e olhando para trás, perceberam que demoraram para pensar como rede. Elas propuseram então que as turmas que hão de vir tenham oportunidade de tomar consciência da importância da rede e da chance que elas têm de participar do programa logo no início, com um tempo dedicado a isso. Elas também deram dicas para que o programa seja sempre mais transparente, de mais apoio e seja mais exigente (para ajudar elas a procurar e dar o melhor delas).
Para concluir, cada uma deu uma palavra que representasse a experiência delas, e vou terminar este artigo nessas palavras. Qual foi o impacto da ASPLANDE nas vidas dessas mulheres? Permitiu um renascimento, uma maturação, uma transformação, e criar conexões … simples assim.
Por Rose MARTIN, Estudante de Sciences Po Grenoble (França) e estagiária na ASPLANDE.